segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Marche aux Flambeaux – Cruz e Sousa (Parte 4)

III

Lobos, tigres, chacais, camelos, elefantes,
hipopótamos, ursos e rinocerontes,
leopardos e leões, panteras acirrantes,
hienas do furor, membrudos mastodontes,
tredas feras do mal, soturnos dromedários,
serpentes colossais que rastejais na treva,
monstros, monstros cruéis, medonhos, sanguinários,
cuja pata esmagante a presa aos antros leva;
ó ventrudos judeus, opíparos, obesos,
de consciência obtusa, ignóbil e caolha
que no mundo passais grotescamente tesos
com honras de entremez e grandezas de rolha;
gafentos histriões, ridículos da moda,
que fingis entender Berlim, Londres, Paris,
mas nos altos salões, por entre a fina roda,
meteis sordidamente o dedo no nariz;
brasonados truões, inúteis como eunuco,
que as pompas ostentais de aurífero nababo
mas apenas valeis como um limão sem suco,
tendes rabo no corpo e dentro d’alma rabo;
nobres de papelão, milionários vândalos
de ventre confortado e rosto rabicundo,
que no torvo cancã, no cancã dos escândalos
sois o horrendo espantalho, a ignomínia do mundo;
ó deuses do milhão, ó deuses da barriga,
que sentindo a aguilhada intensa da luxúria
buscais a mais em flor e linda rapariga
para então vos fartar na luxuriante fúria;
gamenhos de toilette e convicções de lama
onde tudo afinal se atola e se chafurda,
que do clube e do sport sintetizais a fama
mas tendes para o Bem a fibra sempre surda;
palhaços, clowns senis, hediondos borrachos
que aos trambolhões urrais a fora no universo,
desdenhando de tudo e até rindo dos fachos,
do clarão do saber em toda a parte imerso;
almas negras, servis, d’ergástulos caóticos,
gerado no paul das lúgubres voragens,
do crime nos bulcões, nos vícios mais despóticos
aos quais tanto rendeis eternas homenagens,
manequins, charlatães, devassos do bom-tom,
que viveis nas Babéis das grandes capitais
apodrecendo sempre infamemente com
o cancro do dinheiro as forças virginais;
mascarados tafuis de gordos ventres de ouro,
ó bonzos do deboche e cínicos esgares,
que sois o único sol esterlinado e louro
das parvas multidões, das multidões alvares;
fidalgos de barril, sicofantas, malandros
do templo e do bordel, da crápula de harém
que ao puro mar do Ideal, com torpes escafandros,
arrancais, p’ra vender, a pérola do Bem;
ó trânsfugas, ladrões que difamais a terra,
que tudo poluís, do próprio lodo à flor,
à serena humildade, à intrepidez da guerra,
aos beijos maternais, ao nupcial amor;
espíritos de treva, espíritos de barro
que enegreceis de horror o sangue das papoulas
e das ostentações vos aclamais no carro,
cobertos de cetins, arminho e lantejoulas;
que se vem de repente o Nada sepulcral
nunca deixais, sequer, no tétrico leilão,
no leilão da memória, estranho, universal,
nem um som a vibrar do estéril coração!
Dentre feras brutais de ríspidos penhascos
e a torrente caudal de rijos versos francos
e a zombaria e o riso e as sátiras e os chascos,
nesta marche aux flambeaux ides passar, aos trancos!
Do mundo os naturais, zoológicos museus
despejem para fora as pavorosas massas,
para virem reunir-se aos tábidos judeus,
irromper e seguir e desfilar nas praças.
Que a cada mata, a entranha, o seio virgem se abra
jorrando tigres, leões, panteras do seu centro
e na dança infernal, estrupida, macabra,
siga a marche aux flambeaux pelo universo a dentro.

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