segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Vocaboilário – João Rangel Coelho (Parte 2)

Boijudo é Boi engordado,
oboié, do Boi requinta,
boiçal é Boi retardado,
boinitão, Boi boa pinta.

Quando o Boi é Ferdinando,
com tendências feminis,
passa a vida só cheirando
boininas e boigaris.

E, reboilando, ranheta,
a gingar, sem menoscabo,
ele se diz borboileta,
com dois chifres e um só rabo.

Se não encontra – coitado! –
por entre as vacas aceite,
chora o leite derramado,
sem dar às vacas deleite.

Boidelaire e até Boicage,
de poesia tão seleta,
cada qual, conforme age,
deve ser um Boi poeta.

No dicionário do jeca
dizem-se coisas assim:
Boi invertido é boineca,
jornal de Boi, boiletim.

Boiando na crista acesa
de tanta palavra fina,
a boilacha é, com certeza,
biscoito que o Boi rumina.

Para mostrar que ele é
assíduo em coisas bizarras,
a boiate é o cabaré,
onde o Boi faz suas farras.

Boicejo é seca bovina,
boidum do Boi são odores
e bota de Boi, boitina,
é ferradura, senhores.

Boirocoxô é Boi leito,
já macróbio, já sem garra;
boiêmio é Boi de talento,
que passa a noite na farra.

Nesse assunto caricato
(dona Vaca me perdoe),
mas afirmo que boiato
é só fofoca de Boi.

Se o Boi, embora pascácio,
fosse troço e manda-chuva,
seria Zé Boinifácio
ou Quintino Boicaiúva.

Há muitos Bois de tutano
e eu, em resumo, os defino:
Boi da Bahia é boiano,
Boi que dança é boilarino.

Ora, se, ouvindo os meus brados
e os meus períodos incertos,
uns estão aboibalhados,
outros estão boiquiabertos,

se em nosso grupo estupendo,
de apetite aboiminando,
nem todos estão bebendo,
mas todos estão boiando,

encerro o meu verbo obscuro
que, a ferir as vossas oiças,
de tão longo e tão escuro,
parece o túnel Reboiças.

Depois de tanta boutade,
feita de afago e de coice,
já percebi que, em verdade,
meu repertório acaboi-se.

Só por isso, ao despedir-me
e ao deixar este palanque,
imitando, com voz firme,
certo adeus da gíria ianque,

amigos meus, perdoai!
ó minha gente, perdoe!
Se os hippies dizem – “bye! bye!”,
eu só vos digo – “boi! boi!”.

         (“Meu Barro Municipal”, João Rangel Coelho, Arsgráfica Editora Ltda., Duque de Caxias/RJ, 1977, páginas 193 a 197.)

Nenhum comentário:

Postar um comentário