sábado, 30 de janeiro de 2016

Cordel – Roberto Medeiros (Parte 9)

Vade  retro,  Paulipetro
(Paulo Maluf)

Pelas urnas decomposto
Por vezes consecutivas,
Só restou-lhe, a contra-gosto,
Ver outras alternativas...
Traindo todo o seu “clero”
Recorreu a Belzebu,
Que lhe foi muito sincero:
- Ó meu Brutus, até tu?!
Cara-de-pau, mesmo assim,
O Bundão pediu “arrego”:
- Bruxo, prepare pra mim
Um banho de descarrego!...
- Tá bem, vá lá, toma nota
Da receita e com requinte,
“Sexta-feira treze”, bota
Numa banheira o seguinte:

- Sangue de fratura exposta,
Cacos quebrados de louça,
Uma jamanta de bosta
E dois peidinhos de moça.
Naco de queijo Palmira,
Um saquinho de gambá,
Piolho de pomba-gira
E baba de Ali-Babá.
Uma piranha sem mácula,
Setenta conchas de esgoto,
Um dente de Conde Drácula,
Respingos de perdigoto,
Guisado de alho e repolho,
Um tonel de sal-de-fruta,
Cheiro de bode roncolho,
Um beijo falso de puta.
Língua seca de quem bufa,
Inseticida de “spray”,
Unha de velho mucufa
E o bigode do Sarney.
Uma colher de gordura,
Pena preta de tiziu,
Bundinhas de tanajura,
Um extrato de xibiu,
Gosma de vômito abrupto,
Uma caixa de Jontex,
Guela de rato corrupto,
Duas folhas de Eucatex,
Fumo-de-rolo, um só metro,
“Aquele” cheiro de gás,
Dez ações da Paulipetro
E um chulé de Vulcabrás.

Depois do banho, a capricho,
Satanás, muito na dele,
Viu que o Homem virou Bicho
Bem mais horrendo do que ele.
E viu que o Bicho, sem base,
Trocou a mão pela pata
Quando cuspiu essa frase:
“Só estupra, mas não mata”.

Disse, então, o Satanás:
Com esse cara jamais
Eu me meto em lufa-lufa...
E do alto de seus temores,
Preveniu aos eleitores:
- QUEM MALUFA, O RABO ESTUFA.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Cordel – Roberto Medeiros (Parte 8)

Excomunga,  Axé,  Excomunga
(Antônio Carlos Magalhães)

Num terreiro de macumba,
Depois de muita quizumba,
Um famoso Pai-de-Santo
Recebeu, com estranheza,
O Toninho Malvadeza
Com mau-olhado e quebranto.

Melífluo e pegajoso,
Esse bode malcheiroso,
Disse que foi convidado
Para ser o Presidente
Deste País-Continente,
Por Collor esmerdalhado.

Queria, porque, queria,
Que os Orixás da Bahia
Dessem toda a proteção
Ao seu delírio – acredite! –
Ao seu voraz apetite,
À sua imensa ambição.

Incorporado o Cambono,
Resmungando de seu trono,
Agarra os chifres do bicho:
- Qual o quê, “seu” A.C.M.,
Uma idéia assim se espreme
Na lata do nosso lixo!...

Então, você não se manca
Das porradas, da retranca
Que sempre impôs a seu povo?
Quer sugar a nossa veia,
Você quer bexiga cheia
Pra nele mijar de novo?!

O povo não é capacho,
Eu vou fazer um despacho
Pondo fim na malvadeza:
- Alguns charutos baianos
Defumando no seu ânus
Pra dar início à limpeza...

Água fétida de côco,
Diarréia de sufoco,
Gosma azeda de cacau...
Um cocô de tico-tico,
A tal morrinha de mico,
Caracas de berimbau.

Dez lamparinas de azeite,
Vinte e dois baldes de leite,
Mariposas de bordéus...
Sangue de xibiu regrado,
Pragas de genro e cunhado,
Tricas-futricas de Ilhéus.

Vatapá, sarapatel,
Chocalho de cascavel,
Ramela de algum malogro,
Acarajés e cuscus,
Bundinhas sujas de puz,
Obrigado, Amigo Sogro.

Que esse tesão, hoje, seque,
Você que é sócio da NEC
E tem cabeça de merda,
Para nos dar um consolo,
Rumine o próprio miolo
Lá, no Eleva-a-dor Lacerda.

E vá, safado Toninho,
Definhar no Pelourinho,
Na areia do Abaeté...
Pois cá no Farol da Barra,
É o próprio mar que lhe escarra
E o povo lhe nega o Axé.

Depois de muito badalo,
Babalorixá, de estalo,
Sabiamente decidiu:
- Se o povo não mais lhe agüenta,
Eu canto a pedra noventa...
Vá pra puta que o pariu!...

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Cordel – Roberto Medeiros (Parte 7)

 “Quércia  vem  aí...”  (Pra  quê?!)
(Orestes Quércia)

Porraloucando em Campinas,
Já bem chegado a propinas,
Uma cigana, mocréia,
Lhe disse: - Vá, vá Orestes
(Peste maior, dentre as pestes)
Poluir a Paulicéia.

E lhe deu esta receita,
Num tacho de cobre feita,
Assim como o diabo gosta:
- Urina de vaca prenha,
Leite da primeira ordenha,
Bolachas verdes de bosta.

Um olho caolho de sapo,
Latex de genipapo,
Pirilau de lagartixa,
Poeira de quintal vadio,
Gosma de cabra no cio
E menstruação de uma bicha.

Mais ervas propiciatórias,
Vasilinas e chicórias,
Cuspe e jeito, graxa, ungüentos...
Estrovenga sete-léguas,
Inhanhas acesas de éguas,
Sapremadas por jumentos.

Caldo amargo de jiló,
Pinga-brava de forró,
Gororoba de chiqueiro,
Um naco de queijo azedo,
“As verdinhas” do Canhedo
E esterco de galinheiro.

Com essa receita “àviada”
Só vai fazendo cagada
Nos desvãos de sua vida...
Qual andrógino Sanhaço,
Desmunheca, passo a passo,
Numa volúpia incontida.

Sem escrúpulos, sem freios
Esse peão de rodeios,
O “Cow-boy” dos vigaristas,
Quando pode, gargareja
Sua moda sertaneja
Nos vilarejos paulistas.

Esse matuto, capiau,
De enorme cara-de-pau
Toda esculpida a machado...
Na mentira, não se afoba,
Usa óleo de peroba
Quando é desmascarado.

Paraplégico mental,
Indigente cultural,
Munheca-mole, sem força...
E se o seu forte é a inércia
“Abichesque” Orestes Quércia,
Vá ser marido de corça.

Achaques por todo o lado,
Trombadinhas no Mercado,
Procheneta de Motel...
Quanta sujeira na raia!
- Na Vasp, maracutaia
E os trambiques de Israel.

E pleno de atos bandalhos,
Com a moral em frangalhos,
Na maior inconseqüência,
Quer, porque quer, a bichona,
Como se aqui fosse zona,
Gigolar a Presidência.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Cordel – Roberto Medeiros (Parte 6)

LULA:  P.T.  Saudações
(Luiz Inácio Lula da Silva)

Tão feio como o capeta,
Companheiro de zuadas,
Numa campanha careta
Vão de mãos e pernas dadas.

Por seus valores comuns,
Satanás, já no P.T.,
O trouxe de Garanhuns,
Para aprender o A.B.C.

Misto de jegue e cri-cri,
Regente do panelaço,
Vai cagando aqui, ali,
Tal qual um pardal devasso.

Seus comícios viram zona
E se cospe e tagarela
Sua idéia – desmorona
E a gramática – atropela.

Mas, como o “Cara” se atreve
Salvar a Pátria que encalha,
Se nesta ou naquela greve
Atrapalha a quem trabalha?!

Entre fogos de artifício,
Bandeiras cor de paquete,
Grupo de dois é comício,
E grupo de um é piquete.

Trotsquistas e Pelegos
Deste Balaio-de-Gatos,
Têm um olho nos empregos
E os outros, nos Sindicatos.

Vazio... e bem que peleja
Pra se tornar importante:
- Expropria e mercadeja
O “estoque” do Mercadante.

Com jeito de quem não deve,
Faz seu discurso chinfrim
E ouve da Branca de Neve:
- Cai fora, Anão de Jardim!

No P.T., foi aprovado
Por proposta do Capeta:
- Que case bicha com viado
E sapatão com ninfeta.

Só por mentais desarranjos
Num programa vesgo, torto,
Petistas, parteiros de Anjos,
Entronizaram o aborto.

Também o mesmo plenário
Aprovou, majoritário,
Sem qualquer dificuldade,
O seu Projeto de Ação
Chamado “A.Ç.O.”: Abitação,
Çaúde e Onestidade.

Fazendo cambalhotices
E uma série de tolices,
O satã faz festa e pula...
E diz, abanando o rabo:
- Melhor que o próprio Diabo
É essa Besta do Lula!

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Cordel – Roberto Medeiros (Parte 5)

Um  peixe  fora  d’água
ou
“Almirante  Desidratado”
(Almirante Fortuna)

Infortúnio do Fortuna,
Almirante dessa Escuna
Chamada P.S.C.,
Que navega em mar aberto
Sem bússola e porto certo
E ninguém sabe o porquê.

Sem um tripulante a bordo
No porão ou a bombordo
E sem qualquer autocrítica,
Vai à pique na vazante
Sob os silvos do Almirante,
Essa “múmia paralítica”.

Carga de escorbuto e miasma
Leva o “Navio Fantasma”,
Sem comando ou instrumento,
Que supondo navegar,
Lança seus ferros ao mar
E atraca em zero por cento.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Cordel – Roberto Medeiros (Parte 4)

      Agora o Zé do Coité (Roberto Medeiros) fará uma curta sátira àquele que estourava os nossos tímpanos nas propagandas eleitorais do passado, vociferando o seu... MEU  NOME  É  ENÉAS!!!...
      Acho que encontrei a explicação para aquele excêntrico fenômeno. Como ele representava mais ou menos as idéias integralistas e fascistas, com seu sistêmico autoritarismo, a ridícula exposição de sua figura patética servia para desacreditar esta corrente política. Pena que o Dr. Enéas morreu!... Poderia ainda estar nos divertindo e prestando o seu serviço desinteressado à causa do liberalismo e da democracia.

Gnomo  –  O  Terremoto
(Enéas Carneiro)

O candidato do PRONA
Quando ao mundo veio à tona
Viu-se logo o seu estigma,
Pois fazia um anauê
E na fralda do bebê,
Foi bordado um grande Sigma.

Sem cabelo e sem idéias,
Mas barbado, o tal de Enéias,
Sem freio, sem barbicacho,
Na telinha, “detraquê”,
Mais parece uma TV
De cabeça para baixo.

Confuso, tatibitate,
Às vezes mia, outras late
E de repente dispara
Tolice sobre tolice,
Uma porção de sandice
Ignóbil e ignara.

Mas, é certo que o Gnomo
De resto, tem sido o pomo
Da discórdia e controvérsia...
Se dizendo um terremoto,
Aposta que tem mais voto
Do que o Rocha, Amim e o Quércia.

domingo, 24 de janeiro de 2016

Cordel – Roberto Medeiros (Parte 3)

Um  Caudilho  Bigorrilho
(Leonel Brizola)

Estando desocupado
O maldito Satanás,
Preparou um ensopado
Com tempero de água-raz.
- Colocou numa caldeira
Vinho, vinagre, aguardentes,
Chimarrão de feiticeira
E os seguintes ingredientes:

Soda-cáustica, abrasivo,
Sulfato de estricnina,
Suor de nêgo cativo,
Baba de sapo, morfina.
Colocou grampos e tachas,
Sal grosso, urtiga e urutu,
Caldo de lenço e bombachas,
Apetite de urubu.
Rabujos de dez cachorros,
Vil-metal da Fenemê,
Pedido de mil socorros,
“Pelegos” do P.D.T.
E pôs a nata no lixo,
Um coquetel de morrinha
Nos altos-fornos do “bicho”
Que se mexe em “escadinha”.
Cera mofada de orelha,
Fedor que da cuca emerge,
Cieps e Linha Vermelha,
“Fundos” sujos do Banerj,
Enxurradas de besteira,
Saliva que vem e vai,
Latifúndios sem fronteira,
Operação “Ouroguai”.

E tudo isso, efervescente,
Num remexido de merda,
Tomou a forma de gente,
Com as feições de quem herda.

Satanás, achando pouco,
Pôs na cabeça do louco
Lombriga e caraminhola...
E, ao soltá-lo pelo mundo,
Batizou o vagabundo:
- LEONEL DE MOURA BRIZOLA.

sábado, 23 de janeiro de 2016

Cordel - Roberto Medeiros (Parte 2)

Quem  é  Quem?
(Esperidião Amim)

Catifunda, aquela bruxa
Barriga-verde, gorducha,
Na hora que o “bicho” nasceu
Perguntou, franzindo a testa:
Comadre, que “coisa” é esta?
- Se tu não sabes, nem eu.

Ao nascer, nesta cagada,
Q.I. de ameba atrofiada,
Decidiram, na mesma hora,
Pôr um fim nessa tormenta:
- Criar a sua placenta
E jogar o feto fora.

Com os cornos luzidios
Vai queimando os seus pavios
Essa espécie de “avis-rara”
“Que a Natureza, iracunda,
Na cara botou-lhe a bunda,
Na bunda botou-lhe a cara.”

Quem é mesmo esse sujeito,
Candidato neste pleito,
Que é do povo, desconsolo
E do P.P., pesadelo...
“Por fora não tem cabelo
E por dentro não tem miolo.”?!

Figura mefistofélica,
De poder, sempre famélica,
Na sua pele de lobo,
Cospe no ouvido de todos
Seus artifícios, engodos,
Fazendo o povo de bobo.

Aeroporto de mosquito,
Meio abostado e esquisito,
A mim, esse “esperidião”,
- Um E.T. vindo de Vênus –
Não engana e, muito menos,
Ao povo dessa  Nação.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Cordel - Roberto Medeiros (Parte 1)

Cordel dos Presidenciáveis – Roberto Medeiros (Parte 1)
     
         O meu primeiro contato com a Literatura, no balcão da padaria do meu avô paterno, foi o Cordel nordestino, aqueles finos livretos com capas coloridas que adorava ler e reler, sempre à espera de que surgissem novos títulos para devorá-los. Trata-se, a meu ver, de arte literária genuína, posto que espontânea, com esquemas rimáticos e métricos próprios, fruto do imaginário popular. Juntamente com a Trova, é o gênero poético preferido pela população brasileira, que sabe apreciar o que é simples, bom e belo. E se hoje a Poesia acha-se distanciada da grande massa, a “culpa” é do excesso de modernismo e intelectualismo dos “fazedores de versos”, os quais escrevem de maneira tão fria e hermética, tão rebuscada e ininteligível, que seus textos são dirigidos apenas a uma insignificante minoria.
         Foi considerando o extraordinário poder de penetração popular desta forma de Poesia, que o Roberto Medeiros escreveu um livreto intitulado “Literatura de Cordel Sobre os Presidenciáveis de 1994”, usando o pseudônimo de “Zé do Coité – Repentista, / Poeta de botequim, / Cata-pulgas e analista / De político chinfrim”. Fez algumas cópias e as distribuiu para os amigos, e as mesmas circularam por toda a parte. Trata-se de uma crítica mordaz e divertida aos candidatos à Presidência da República nas Eleições daquele ano. Foram contemplados com versos ferinos: Esperidião Amim, Leonel Brizola, Enéas, Almirante Fortuna, Lula e Orestes Quércia. Numa segunda parte, chamada “E os Ex-Futuros-Quase ou ‘Coitos-Interrompidos’ ”, o achincalhe dirige-se a Antônio Carlos Magalhães e  Paulo Maluf.
         Omiti o nome de Fernando Henrique Cardoso, o qual, como todos sabem, saiu vitorioso nas urnas. Acontece que este candidato foi o único que mereceu elogios do “Zé do Coité”, devido a razões políticas, obviamente.
         Com o extremo desgaste dos políticos junto ao povo, cansado de corrupções desenfreadas daqueles que deveriam representá-los, mas que apenas se importam consigo próprios, traindo os interesses populares, a leitura dos versos a seguir é extremamente prazerosa, uma forma sutil de revanche e vingança.
         O livreto era dividido em duas seções. A Primeira Parte chamava-se “Literatura de Cordel Sobre os Presidenciáveis de 1994”. Em ordem alfabética, haviam sete candidatos: Amim, Brizola, Enéias, Fernando Henrique, Fortuna, Lula e Quércia. A Segunda Parte chamava-se “E os Ex-Futuros-Quase ou ‘Coitos-Interrompidos’ ”. Também em ordem alfabética, estavam ali presentes: A.C.M., Maluf, Queiroz e Rocha.  A todos o Roberto criticou, elogiando apenas o Fernando Henrique Cardoso, que acabou sendo o sucessor do Itamar. Tempos depois escrevi uma crítica ao FHC, na mesma forma literária, considerando o seu péssimo “Governo”. Resultado: não tenho mais os dois textos. E na cópia xerográfica deste Cordel em meu poder, também não disponho mais dos dois últimos, Queiroz e Rocha.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Glosa - Roberto Medeiros e Marcos Nunes Filho

GLOSA

NÃO HÁ CRIANÇA VADIA...
E AS QUE ESMOLAM A TEUS PÉS,
SÃO ANJOS QUE DEUS ENVIA
PARA SABER QUEM TU ÉS.
Roberto Medeiros



“NÃO HÁ CRIANÇA VADIA...”
mas, pobre, na mendicância.
O ofício da fantasia
é o labor de toda infância.

Crianças, nesta aflição,
“E AS QUE ESMOLAM A TEUS PÉS,”
passando de mão em mão,
vão levando pontapés.

Sendo filhas da agonia,
nesta miséria feroz,
“SÃO ANJOS QUE DEUS ENVIA”
para testar todos nós.

O menor abandonado,
sob o teto do revés,
é um anjo por Deus mandado
“PARA SABER QUEM TU ÉS”.


Marcos Nunes Filho

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Trovas Inéditas - Roberto Medeiros (Parte 2)

Trovas Inéditas
Roberto Medeiros
(Juiz de Fora - MG

É tão grande o seu amor
e a sua bondade é tanta
que, Mamãe, chego a supor
que Deus a fez uma Santa.

A boa pinga sublima,
num arco-íris de emoção...
- Quando a bebo prendo a rima
e liberto o coração.

Nosso amor, ora rompido,
deixou-me, assim, neste estado:
- Triste, por tê-la perdido;
alegre, por ter me achado.

Teus carinhos são espelhos
refletindo inquietação:
- São os glóbulos vermelhos
de minha circulação.

Envolto neste mistério,
fico, assim, me perguntando
se brincas, falando sério,
ou falas sério, brincando...

Tal qual fiandeira-mestra
a fantasia, em serão,
faz regime de “hora extra”
na minha imaginação.

Nos leilões e nas quermesses
das festas de nossa aldeia,
apesar de minhas preces,
foste prenda em mão alheia!

Jamais me peça, querida,
seja qual for a razão,
que abandone uma partida
cujo prêmio é o coração!

Teus carinhos são esbulhos
de pequenas coisas tolas:
- São como os meigos arrulhos
de um casal de pombas-rolas!

Ao sonhar com teus agrados,
acordei sem teus carinhos:
“cabelos esbugalhados
e os olhos em desalinhos”...

Do teu beijo estou saudoso,
em que pesem meus ressábios,
porque sei que o mais gostoso
sempre fica nos teus lábios.

Suporto com altivez
os revezes da partida:
- Somos peças de Xadrez
no tabuleiro da vida.

Para ver-te a tudo agarro,
não tem hora nem distância...
Vou a pé, de bonde ou carro,
e até mesmo de ambulância...

Teus carinhos, invernadas
de beijos, em torvelinho,
são estouros de boiadas
numa curva de caminho!

Fantasia, qual espuma,
ao sopro do coração,
vai espocando, uma a uma,
como bolha de sabão.

Não chores, Mãe, se em teu peito
não posso mais me abrigar:
- O rio deixa o seu leito
e cai nos braços do mar.

Um bebedor pouco esperto,
da vida não sabe nada:
freqüenta o boteco certo,
mas bebe a cachaça errada.

Esta neblina, aos pouquinhos,
fez-me triste como o dia...
Vem, amor, com teus carinhos

aquecer minha alma fria...

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Trovas Inéditas - Roberto Medeiros (Parte 1)

Trovas Inéditas
Roberto Medeiros
(Juiz de Fora - MG

No meu pão de cada dia,
cozido ao forno da mente,
alimento a fantasia
para que ela me alimente.

Se a sorte traz em seu manto
felicidade e perfídia,
o nosso amor teve o encanto
e a duração de uma orquídea.

Sinto em minha alma um vazio,
pois me falta o seu conforto.
Sou como um velho navio
despedido de seu porto...

Se eu disse uma frase a esmo,
não quis, amor, te magoar...
Seria ofensa a mim mesmo,
que vive pra te adorar!...

Teus carinhos são o anel
de nosso enlace bizarro:
- São como lua-de-mel
em casa de João-de-Barro!

Não há viagem mais feliz
do que ir, devagarinho,
do teu queixo ao teu nariz,
parando... em meio caminho...

No Dia das Mães, quizera
que a Natureza tão franca,
fosse toda Primavera
sem uma só Rosa Branca.

Se a falta dela me prende
nesta noite escura e fria,
acende, saudade, acende
as velas da fantasia.

Meu Pai, darei a seus netos
estas jóias que não somem:
- Os seus exemplos tão retos,
e as suas virtudes de Homem.

Os teus carinhos sutis,
de requintados ardores,
são inquietos colibris,
amantes loucos das flores!

No Xadrez, jogo profundo,
respondo lance por lance;
mas, em seus lances, o mundo
nunca me deu igual chance.

A cachaça com pureza
é uma sublime alquimia:
volatiliza a tristeza,
materializa a alegria.

O encanto do teu sorriso
esconde um dilema eterno:
- Ou nos leva ao paraíso
ou nos conduz ao inferno.

Do nosso mundo bem longe,
imerso em meditação,
tão perto de Deus, o monge
não vive na solidão.

Teus carinhos são perfídias...
flores de estufa do ciúme:
- São sensíveis como orquídeas
no fascínio do perfume!

Tristeza traz alegria,
tempestade traz bonança,
a noite conduz ao dia,
e o dia traz esperança.

Passa o dia à escuridão...
tudo passa e se desfaz...
Só não passa esta paixão...
cada vez aumenta mais...

Com as tintas da saudade
Vinícius, triste, escrevia,
no anverso da realidade,
o verso da fantasia.

Os teus encantos, amor,
minha inspiração sublima...
Se acaso eu fosse pintor
serias minha obra-prima...

Os teus carinhos marotos
arrasam meu coração:
- São nuvens de gafanhotos
em cima da plantação!

Mais que apego, zelo, excesso,
carinho, afeto, ternura...
mais do que amor, eu confesso,
tenho por você loucura!...

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Trovas Classificadas - Roberto Medeiros

Trovas Classificadas
Roberto Medeiros
(Juiz de Fora – MG)

Não há criança vadia...
E as que esmolam a teus pés,
São anjos que Deus envia
Para saber quem tu és.

Liberdade, a tua essência
Sempre exerce este fascínio:
- Quem viveu tua existência
Não suporta o teu declínio.

Dentre os mais belos conselhos,
Faço deste a minha fé:
- “A ter que viver de joelhos,
Prefiro morrer de pé”.

Pobre de quem, por conforto
A tudo o mais renuncia:
- Há sempre um poeta morto
Num homem sem fantasia.

“A bolsa ou a vida”, eu ouço
E retruco as ironias:
- Que leve as duas, seu moço,
Pois ambas estão vazias.

A fantasia, acredito,
Pelo toque de abstrato,
É verso por Deus escrito,
Oculto no anonimato.

Teu Dia, Mãe, se reveste
Dos remorsos que chorei:
Pelo muito que me deste,
Pelo pouco que te dei.

Quando a alma se condena
No Tribunal da Saudade,
A solidão é a pena
Que se cumpre em liberdade.

Ferido por teu desprezo
Nesta noite sem carinho,
Sou igual cigarro aceso,
Que vai queimando sozinho.

Esquiva, assim como as garças,
Tu foges ao meu afago,
Deixando “penas” esparsas
Na solidão do meu lago.

Não faz falta em meu arquivo
O seu retrato, querida:
- A saudade é o “negativo”
Que guardo por toda vida.

Um anjo, doce criança,
Com seu encanto e magia,
Transformou numa aliança
Nosso anel de fantasia.

Meus avós dizem sorrindo:
Nem só o pólen dá flor:
- Ternura é seiva nutrindo
O galho seco do amor.

Não se deve esperar nada
Em paga de boa ação:
- Ainda não foi cunhada
A moeda da gratidão.

Nosso amor – estranho jogo
Entre o sonho e o pesadelo:
Se ora queima como fogo,
Ora esfria como gelo.

A trova é como a criança
Que de colo em colo vai,
Quanto mais glórias alcança
Menos se lembra do pai.

Se indagas por novidade,
Constrangido, amor, te digo:
Em tua ausência a saudade
Resolveu casar comigo.

Se teu cais não mais te ancora,
Se te falta a estrela-guia,
Vai coração, mar afora,
Ao sopro da fantasia.

Qualquer que seja o sabor
Ou modo que se apresente,
O beijo é gota de amor
Que hidrata a alma da gente.

Parece o teu coração
Com plataforma de trem,
Que mal despede os que vão
Para abrigar os que vêm.

A vizinha quer saber
Porque, prudente, me escondo:
- Jamais se deve mexer
Em caixa de marimbondo.

Se o dia acorda avarento
E me recusa um bom-dia,
Eu peço carona ao vento
E pouso na fantasia.

Um ébrio, mal o distingo
Da chuva que vem e vai:
- Ela cai de pingo em pingo,
De pinga em pinga, ele cai.

De derrame cerebral
A morte não se lastima:
- Que sorte descomunal
Te faltar matéria-prima.

Esquisito se faz troça
Cheirando a naftalina:
Quando afina... a voz engrossa,
Quando “engrossa”... a voz afina.

O imbecil galvanizado
Que proclama seu talento...
- Ou já nasceu retardado
Ou fez depois treinamento.

Vinte e cinco de Dezembro...
Natal – meu mundo encantado –
Com que ternura me lembro
Dos “presentes” do passado.

Quem semeia, na alvorada,
Sem a terra bendizer,
Mais tarde não colhe nada
Que valha a pena colher.

Se prometemos a miúdo,
Não mais brigarmos, amada,
Se o amor para nós é tudo
Por que brigamos por nada?

As trovas, quando brejeiras,
São abelhas encantadas:
- Diligentes recadeiras

Das flores apaixonadas.