A
ORIGEM DO MÊNSTRUO
Bernardo Guimarães
De uma fábula de Ovídio achada nas escavações de
Pompéia
e vertida em latim vulgar por Simão de Nuntua.
Stava
Vênus gentil junto da fonte
fazendo
o seu pentelho,
com
todo o jeito, pra que não ferisse
das
cricas o aparelho.
Tinha
que dar o cu naquela noite
ao
grande pai Anquises,
o
qual, com ela, se não mente a fama,
passou
dias felizes...
Rapava
bem o cu, pois, resolvia
na
mente altas idéias:
-
ia gerar naquela heróica foda
o
grande e pio Enéias.
Mas
a navalha tinha o fio rombo,
e
a deusa, que gemia,
arrancava
os pentelhos e peidando,
caretas
mil fazia!
Nesse
entretanto, a ninfa Galatéia,
acaso
ali passava,
e
vendo a deusa assim tão agachada,
julgou
que ela cagava...
Essa
ninfa travessa e petulante
era
de gênio mau,
e
por pregar um susto à mãe do Amor,
atira-lhe
um calhau...
Vênus
se assusta. A branca mão mimosa
se
agita alvoroçada,
e
no cono lhe prega (oh! caso horrendo!)
tremenda
navalhada.
Da
nacarada cona, em sutil fio,
corre
purpúrea veia,
e
nobre sangue do divino cono
as
águas purpureia...
(É
fama que quem bebe dessas águas
jamais
perde a tesão
e
é capaz de foder noites e dias,
até
no cu de um cão!)
-
“Ora porra!” – gritou a deusa irada,
e
nisso o rosto volta...
E
a ninfa, que conter-se não podia,
uma
risada solta.
A
travessa menina mal pensava
que,
com tal brincadeira,
ia
ferir a mais mimosa parte
da
deusa regateira...
-
“Estou perdida!” – trêmula murmura
a
pobre Galatéia,
vendo
o sangue correr do róseo cono
da
poderosa déia...
Mas
era tarde! A Cípira, furibunda,
por
um momento a encara,
e,
após instantes, com severo acento,
nesse
clamor dispara:
“Vê!
Que fizeste, desastrada ninfa,
que
crime cometeste!
Que
castigo há no céu, que punir possa
um
crime como este?
Assim,
por mais de um mês inutilizas
o
vaso das delícias...
E
em que hei de gastar das longas noites
as
horas tão propícias?
Ai!
Um mês sem foder! Que atroz suplício...
Em
mísero abandono,
que
é que há de fazer, por tanto tempo,
este
faminto cono?
Ó
Adonis! Ó Júpiter potentes!
E
tu, Mavorte invito!
E
tu, Aquiles! Acudi de pronto
da
minha dor ao grito!
Este
vaso gentil que eu tencionava
tornar
bem fresco e limpo
para
recreio e divinal regalo
dos
deuses do Alto Olimpo,
Vede
seu triste estado, ó! Que esta vida
em
sangue já se esvai-me!
Ó
Deus, se desejais ter foda certa
vingai-nos
e vingai-me!
Ó
ninfa, o teu cono sempre atormente
perpétuas
comichões,
e
não aches quem jamais nele queira
vazar
os seus colhões...
Em
negra, podridão imundos vermes
roam-te
sempre a crica,
e
à vista dela sinta-se banzeira
a
mais valente pica!
De
eterno esquentamento flagelada,
verta
fétidos jorros,
que
causem tédio e nojo a todo mundo,
até
mesmo aos cachorros!”
Ouviu-lhe
estas palavras piedosas
do
Olimpo o Grão-Tonante,
que
em pívia ao sacana do Cupido
comia
nesse instante...
Comovido
no íntimo do peito,
das
lástimas que ouviu,
manda
ao menino que, de pronto, acuda
à
puta que o pariu...
Ei-lo
que, pronto, tange o veloz carro
de
concha alabastrina,
que
quatro aladas porras vão tirando
na
esfera cristalina
Cupido
que as conhece e as rédeas bate
da
rápida quadriga,
co’a
voz ora as alenta, ora co’a ponta
das
setas as fustiga.
Já
desce aos bosques onde a mãe, aflita,
em
mísera agonia,
com
seu sangue divino o verde musgo
de
púrpura tingia...
No
carro a toma e num momento chega
à
olímpica morada,
onde
a turba dos deuses, reunida,
a
espera consternada!
Já
Mercúrio de emplastros se aparelha
para
a venérea chaga,
feliz
porque aquele curativo
espera
certa a paga...
Vulcano,
vendo o estado da consorte,
mil
pragas vomitou...
Marte
arranca um suspiro que as abóbadas
celestes
abalou...
Sorriu
a furto a ciumenta Juno,
lembrando
o antigo pleito,
e
Palas, orgulhosa lá consigo,
resmoneou:
- “Bem-feito”!
Coube
a Apolo lavar dos roxos lírios
o
sangue que escorria,
e
de tesão terrível assaltado,
conter-se
mal podia!
Mas,
enquanto se faz o curativo,
em
seus divinos braços,
Jove
sustém a filha, acalentando-a
com
beijos e com abraços.
Depois,
subindo ao trono luminoso,
com
carrancudo aspecto,
e
erguendo a voz troante, fundamenta
e
lavra este DECRETO:
-
“Suspende, ó filha, os lamentos justos
por
tão atroz delito,
que
no tremendo Livro do Destino
de
há muito estava escrito.
Desse
ultraje feroz será vingado
o
teu divino cono,
e
as imprecações que fulminaste
agora
sanciono.
Mas,
inda é pouco: - a todas as mulheres
estenda-se
o castigo
para
expiar o crime que esta infame
ousou
para contigo...
Para
punir tão bárbaro atentado,
toda
humana crica,
de
hoje em diante, lá de tempo em tempo,
escorra
sangue em bica...
E
por memória eterna chore sempre
o
cono da mulher,
com
lágrimas de sangue, o caso infando,
enquanto
mundo houver...”
Amém!
Amém! como voz atroadora
os
deuses todos urram!
E
os ecos das olímpicas abóbadas,
Amém!
Amém! sussurram...
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