“O lugar do poeta, parece-me, é entre os
Srs. Hydes da natureza humana. Ele deve ser, como observou Blake a respeito de
Milton, ‘do partido do diabo sem o saber’ – ou, preferivelmente, com a plena
consciência de ser do partido do diabo. Já há tantos anjos intelectuais e
morais, batalhando pelo racionalismo, pela boa cidadania e pela espiritualidade
pura; há os tantos e tão eminentes, loquazes e autoritários! O pobre diabo que
está no homem necessita de todo o apoio e de toda defesa que possa arranjar. E
o artista é que é seu defensor natural. Quando um artista deserta e se passa
para o lado dos anjos, dá-se a mais odiosa das traições. Tolstoy, por exemplo,
como é imperdoável! Tolstoy, o Sr. Hyde perfeito, a mais completa encarnação,
como jamais existiu outra, da vida instintiva, não-moral e não-intelectual –
Tolstoy, que traiu sua própria natureza, traiu também a arte e traiu a vida em
si mesma, para lutar contra o partido do diabo de suas antigas simpatias, sob o
pálio do Dr. Jesus-Jekyll.”
(“Satânicos e Visionários”, de Aldous
Huxley, Companhia Editora Americana, Rio de Janeiro, 1975, Páginas 83-84.)
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