domingo, 3 de janeiro de 2016

Poemas de Mauro Fonseca - Parte 5

ocasião de vida e beco


do metal (vida)
que minha boca beija
                                         - apedreja esses falsos anjos
                                arremessa essa faca
                                                   contra o peito cabeludo de baco
                                                         contra os seios dessa santa de gesso
se o sal
não tempera
(sobre sua mesa
o jarro de flores
e as frutas de cera)
                              - engana esse fogo
                                  acenda um cigarro
                                      após o ofício do soco.

IIº

do beco
outros passaram
acenaram
cuspiram
verteram fogo gás neon
e o beco e o beco
já foi varado por crianças
já foi varado por nós e nossos filhos
o beco ainda lembra maria, rita, luzia,
mas o beco
o beco abre hoje
um cabaré com novas mulheres
e a gente passa por lá (todas as noites)
com a boca despedaçada
com o bigode fedendo a nicotina
entre lâmpadas eternamente apagadas
o beco
o beco é sempre beco
de baco da santa de nós e nossos filhos
o beco resiste beco
entre fogo sal neon e edifícios.

x-x

estilhaços

escorada na boca
                    a faca fede
encarnada na noite
                      seu fio corta

                                      desconhece a fada puta
                                      que não cabe na estória
                                           que não encanta mais nada

fincada nos olhos
                     da cena sangra
talhada no rosto
                    a marca única.

x-x

recado

não, não represento nada
nesse cenário atônito, atômico
não sou nenhum domador de tempestades
eu, em particular, prefiro contemplar as estrelas
que permanecem indiferentes
às nossas leis, lutas e verdades.

x-x

serra esta janela vil que te separa
dos doentes das moscas dos vermes
porque tudo que é podre exala odor
de sangue amassado de tormentos de
presságios e temor. serra esta ja-
nela vil que te engana que te esconde
do esqueleto da verdade e que te faz
palhaço e que te faz insano ao polir
o metal efêmero da vaidade. serra esta
janela vil dos homens comuns que te cegam
que te guardam dentro de um baú
desta impaciência desta violência
que não faz jejum e que te espreita
na sombra de uma esquina porque tu és
carniça, és prato de urubu. serra esta
janela vil que te faz mais um
o amargo do boldo ao descaso do nu
à bílis por acaso até à palidez do pus
que te faz de pedra mármore bronze gesso
aço cru que te faz herdeiro deste barco ao mar
sem o timoneiro sem rumo nenhum
sem luz do farol sem sinal de porto algum.

Nenhum comentário:

Postar um comentário