domingo, 13 de dezembro de 2015

Mudez - Francisca Júlia

Já rumores não há, não há; calou-se
Tudo. Um silêncio deleitoso e morno
Vai-se espalhando em torno
Às folhagens tranquilas do pomar.

Torna-se o vento cada vez mais doce...
Silêncio... Ouve-se apenas o gemido
De um pequenino pássaro perdido
Que ainda espaneja as suas asas no ar.

Ouve-me, amiga, este é o silêncio, o grande
Silêncio feito só de sombra e calma,
Onde, às vezes, noss′alma,
Penetrada de mágoas e de dor,
Se dilata, se expande,
E seus segredos íntimos mergulha...
Prolonga-se a mudez: nenhuma bulha;
Já se não ouve o mínimo rumor.

Esta é a mudez, esta é a mudez que fala
(Não aos ouvidos, não, porque os ouvidos
Não conseguem ouvir esses gemidos
Que ela derrama, à noite, sobre nós)
À alma de quem se embala
Numa saudade mística e tranquila...
Nossa alma apenas é que pode ouvi-la
E que consegue perceber-lhe a voz.

Escuta a queixa tácita e celeste
Que este silêncio fala a ti, tão triste...
E hás de lembrar o dia em que tu viste
Perto de ti, pela primeira vez,
Alguém a quem disseste
Uma frase de amor, de amor... ó louca!
E que, no entanto, só mostrou na boca
A mais brutal e irônica mudez!

(Esfinges, 1903.)

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