Em
1982, o meu saudoso amigo, poeta Mauro Fonseca, publicou um livreto chamado
“Não Sou Náufrago na Ilha de Ninguém”, Naveta Publicações, desenhos de Fernando
Motta Rodrigues, Juiz de Fora/MG, que dedicou aos seus pais, composto de 15
pequenos poemas, os quais irei transcrever a seguir, prestando-lhe, assim, uma carinhosa
homenagem:
x-x
‘ei amigo, conhecei bem o
porão de vossa casa!’
x-x
palavras sob mira 1
não, não produz
nenhuma pedra.
(invento de luz
nos seios da treva)
nunca a palavra
estranha seduz,
torna amarga
e nada traduz.
x-x
onipotente sol onipotente
sei das luzes
deuses
mas nem deuses
como luzes
(apenas o sol)
quero deus
luz
mas nem luz
como deus
(apenas o sol)
x-x
aspirinas
então morder as mãos
cuspir sangue pelo corredor
chegar à sala
e agredir os móveis
derrubando louças
quebrando cristais
gritar até que os olhos
caiam
e saiam pela boca palavras e
bílis
depois voltar ao quarto
e adormecer
sem nenhum compromisso
de amanhã acordar
e voltar à vida.
x-x
estranha visita
não riu das piadas
nem contou nenhuma.
(não havia mar
nem sinal de porto algum)
permaneceu sentado
não aceitou o café, nem
muito menos o drink
apenas olhava para nós
apenas continuava olhando
para nós.
x-x
pequeno ensaio
pros sobrinhos cleber,
diogo, thiago, roberta,
ana carolina e os que ainda
virão
um dia desses
a gente mostra ao espelho
algo mais que cravos e
espinhas
um dia desses
a gente deixa de conservar
na geladeira
os princípios da família
um dia desses
a gente ensina nossas mães
a pronunciar (direitinho)
nossos nomes
um dia desses
um bando de fadas e anjinhos
removerá o telhado escuro da
casa dos homens
um dia desses
o tio fica louco...
x-x
palavras sob mira 2
secar o poço
anistiando a sede
queimar o trigal
abolindo a fome
rasgar a roupa
desatando o nu
desencantando o homem.
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