homem
prepotente o homem
surpreendente o homem
onisciente o homem
onipotente o homem
- nas horas vagas
morre de medo e de fome.
x-x
das flores
se digo flores
tão incertas
vidas que abrigam
os horizontes de tábuas
misérias
por entre tocos fincados
cobertos de zinco
lacrados com pregos
morada dos famintos
das flores e dos cegos.
se lembram das flores
da fome esquecem...
ah, não maldigo
as flores que lá crescem.
x-x
invadiram o palco
em meio ao espetáculo
aleijaram a bailarina
cortaram as mãos do
equilibrista
cegaram o engolidor de fogo
depois entraram nos camarins
e quebraram as luzes e os
espelhos
rasgaram as fantasias
surraram o bilheteiro
voltaram urinando na lona
até o picadeiro
insultando a platéia
que de pé aplaudia
a cena em que os palhaços
eram jogados aos leões.
x-x
noite prostituta
hoje não vou beber leite
essa noite eu supuro minha
úlcera
faço uma festa
e convido a puta da esquina
o bêbado irrecuperável
o guerrilheiro paranóico
o poeta e a travesti
escandalizo a vizinhança
desabo sobre a mesa
fogos de artifício
enchendo de luzes e berros a
cidade
que fede a silêncio e
escuridão.
x-x
espetáculo de hoje
não,
ninguém comoveu a platéia
e os aplausos
foram só por alguns minutos.
depois que finalmente
abaixarem as cortinas
todo o sangue será lavado do
palco.
amanhã,
talvez a mesma platéia volte
para ocupar as mesmas
cadeiras
que esperarão em silêncio.
amanhã vocês terão outra
chance.
x-x
uma questão de ótica
eu sob o teto
o palco da minha cidade
desfilo
com óculos escuros
de camelô
aguardando a tempestade
sem nenhum pudor.
x-x
na festa das feras
o estranho poeta surdo
sai pela porta dos fundos
sangrando
x-x
palavras sob mira 3
apagar
os olhos
inventar segredos
talvez um porão
bem mais fundo
mais profundo
um abismo talvez.
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