domingo, 20 de dezembro de 2015

O Poema das Vogais - Pethion de Vilar

O Poema das Vogais
Pethion de Vilar
(Poeta simbolista brasileiro.)

Ao impecável estilista Remy de Gourmont

“...................................................voyelles,
“Je direi quelque jour vos naissances latentes.”
(A.  Rimbaud.)

A – branco.
   O – preto.
      U – roxo.
         I – vermelho.
            e
               E – verde.

Sim, toda vogal tem um aroma e uma cor,
Que sabemos sentir, que poderemos ver de
Cima do Verso, de dentro do nosso Amor.

                                 A

A – deslumbrante alvor; lagoas de neblina,
Mortas entre bambuais em noites de luar;
Panejos de albornoz; celagens de morfina;
Hóstias subindo, lento, entre os círios do altar.

Neve solta a cair; runimóis do Himalaia;
Palidez de noivado; asas pandas de cisne;
Estátuas; colos nus; penumbras de cambraia;
Pétala de magnólia antes que um beijo a tisne.

                                   O

O – negrumes do mar; torvas noites de chuva;
Escuridão dos teus cabelos perfumados;
Gargantas de canhões; compridos véus de viúva,
Longos dias cruéis dos que não são amados.

Veludo que reveste a petrina das moscas,
Dessas que vão pousando em tudo, sem respeito,
E um dia hão de zumbir, gulosas, sobre as roscas
Alvas e frias do teu corpo tão bem feito!

                                    U

U – lúgubres clarões agônicos de enxofre;
Cor do Mistério; cor das paixões sem consolo;
Soluço há muito preso, estourando de chofre;
Último beijo, olhar vesgo e triste de goulo.

Olheiras de Saudade; olheiras de Ciúme;
Chagas místicas de S. Francisco de Assis;
Clangores d’órgão que poeta algum resume;
Desilusões de amor que nenhum verso diz.

                                     I

I – púrpuras reais alcachofradas de ouro;
Rubores virginais; lacre de bofetadas;
Fanfarras de clarim; alamares do toro
Onde o carrasco abate as frontes rebeladas.

Sangue escarrado das bocas tuberculosas;
Sangue da aurora; orvalho ardente das batalhas;
Sangue das uvas; sangue aromado das rosas;
Farrapos de bandeira assanhando metralhas!

                                     E

E – febre do uíste, cor das campinas em flor,
Transparências de absinto; alma da mata virgem;
Cor da Esperança; paz das vigílias do amor;
Mortalhas, que do mar as glaucas ondas cirgem.

Hieróglifos que Deus ou o Diabo escreve
Nas frontes geniais dos Bardos e dos Sábios;
Espáduas sobre as quais a Morte, muito em breve,
Voluptuosamente há de colar os lábios.

Nenhum comentário:

Postar um comentário