sábado, 24 de outubro de 2015

Mãos - Augusto dos Anjos

Mãos

      Há mãos que fazem medo
Feias agregações pentagonais,
Umas, em sangue, a delinquentes natos,
Assinalados pelo mancinismo,
      Pertencentes talvez...
Outras, negras, a farpas de rochedo
      Completamente iguais...
Mãos de linhas análogas e anfratos
Que a Natureza onicriadora fez
Em contraposição e antagonismo
Às da estrela, às da neve, ás dos cristais.

Mãos que adquiriram olhos, pituitárias
Olfativas, tentáculos sutis,
E à noite, vão cheirar, quebrando portas
O azul gasofiláceo silencioso
      Dos tálamos cristãos.
Mãos adúlteras, mãos mais sanguinárias
E estupradoras do que os bisturis
Cortando a carne em flor das crianças mortas.
      Monstruosíssimas mãos,
Que apalpam e olham com lascívia e gozo
A pureza dos corpos infantis.

(“Eu & Outras Poesias”, Augusto dos Anjos, Editora Civilização Brasileira S.A., Rio de Janeiro, Livraria Itatiaia Ltda., Belo Horizonte, 2º Volume, 1982, Página 60.)

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